IMBRÓGLIO

Atraso na folha de pagamento é “pedra no sapato” nas primeiras semanas dos novos prefeitos no interior do Ceará

Em algumas cidades, manifestações e paralisações de trabalhadores cobram responsabilidade dos atuais gestores sobre dívidas das administrações passadas

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12 de janeiro de 2021
Ninho Digital

Em Juazeiro do Norte, no Cariri, trabalhadores discutem uma possível paralisação. Em Acarape, em outro extremo do interior cearense, os servidores já foram às ruas. A pauta é comum nos dois municípios e em outros no Estado: atrasos nas folhas de pagamento. As cidades passaram, no último dia 1º de janeiro por transição na gestão municipal. Saiu o prefeito apoiado por um grupo e assumiu outro, que estava na oposição. O problema se repete em, pelo menos, 25 locais do Ceará em que houve troca de governantes.

Atraso na folha de pagamento é “pedra no sapato” nas primeiras semanas dos novos prefeitos no interior do Ceará
Em Acarape, trabalhadores fizeram manifestação para cobrar os vencimentos

A situação impacta nas primeiras ações dos novos prefeitos, que em vez de focar nos compromissos assumidos em campanha, são obrigados a se responsabilizar pelas dívidas deixadas pelos antigos gestores. De acordo com Carmem Santiago, vice-presidente da Federação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal do Estado do Ceará (Fetamce), o processo é chamado de desmonte municipal – atos que causam a desorganização administrativa após as eleições.

Amontada é um dos municípios citados na lista da Fetamce sobre atrasos salariais referentes à folha de pagamento de dezembro. A Prefeitura ainda deve 50% do 13º salário dos profissionais da Secretaria Municipal de Educação. De acordo com Flávio Teixeira, novo chefe de gabinete, o atual mandatário analisa as contas deixadas pelo antigo gestor. “Boa parte do saldo existente se refere a convênios que não podem ser utilizados nos pagamentos dos servidores. A gestão deve pagar 50% da folha de dezembro de 2020 nesse mês de janeiro”, avalia. O município faz uma análise financeira para apresentar aos servidores, nas próximas semanas de janeiro, um plano de parcelamento referente a outra metade do salário e ao subsídio de fim de ano da Educação.

A situação é ainda mais complicada em Acarape, no Maciço de Baturité. Alguns trabalhadores estão sem salários desde novembro, segundo a Fetamce. Entretanto, segundo um ex-funcionário, existem pessoas que não recebem desde setembro do ano passado, algumas da área da saúde, que atuaram durante o pico da crise sanitária. “O nosso pagamento nunca teve uma data específica, sempre era essa humilhação de tá perguntando aos secretários e nas rádios locais da cidade vizinha pra saber quando iríamos receber”, revela a professora Brena Sales.

O ex-prefeito, Franklin Veríssimo, admitiu o atraso no segundo semestre e associou o problema nos repasses aos “elevados gastos” no combate à Covid-19. “Isso porque não medimos esforços e não economizamos recursos para salvar vidas”, escreveu. A atual gestão foi procurada pelo GCMAIS para comentar as ações tomadas para solucionar o imbróglio, mas até o momento, nenhuma mensagem foi respondida.

No Cariri, Juazeiro do Norte e Barbalha passaram pelas transições de prefeitos. Nas duas cidades, os servidores cobram das respectivas administrações, a folha de pagamento referente a dezembro.

Na primeira, o Sindicato dos Servidores Municipais de Juazeiro do Norte (Sisemjun) já convocou até paralisação na segunda semana do ano. Gledson Bezerra, que assumiu a gestão municipal em 1º de janeiro, afirmou ao Jornal da Cidade que, por conta da limitação do caixa da prefeitura, o pagamento dos efetivos será priorizado. Em Barbalha, a gestão informou que deve fazer, nos próximos dias, uma apresentação sobre a saúde fiscal e as dívidas que o antigo gestor deixou.

Novos prefeitos em um novo normal

A Frente Nacional de Prefeitos (FNP) pontua que “o primeiro ano é muito importante para desenhar como será o governo e, como todo planejamento, não pode ser estático”. Com a pandemia de coronavírus, os recursos, principalmente no interior, tendem a ficar ainda mais escassos em 2021, complicando ainda mais a atuação dos novos prefeitos.

“O socorro da União aos municípios não tem como se repetir em 2021. É um ano de muito desafio na parte fiscal”, aponta José Ronaldo de Castro Souza Júnior, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em entrevista à Agência Brasil. “Os gestores municipais estão sem quase nenhuma disponibilidade de caixa para políticas públicas, investimentos e gastos que não sejam pagar salários”, completa.

Desde o fim de 2020, o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Ceará (TCE) fiscalizam as mudanças nas prefeituras para apurar possíveis irregularidades. “Nosso objetivo é manter a legalidade e o respeito ao interesse coletivo, atuando de forma preventiva para garantir a continuidade do serviço público e evitar possível dilapidação do patrimônio”, detalhou o presidente da Corte, Conselheiro Valdomiro Távora.

A Associação de Prefeitos do Ceará (Aprece) ressalta o cuidado que os prefeitos devem ter, ao deixar o Executivo. Entre as recomendações está o “o fidedigno registro da situação com gastos de pessoal para que a próxima gestão tenha total ciência da situação”. Em caso de atraso na folha de pagamento, cabe ao novo titular reconhecer a dívida e o tempo para quitação, segundo orientação antidesmonte do MPCE.

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