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Artista cearense Ivan Guimarães leva exposição de xilogravuras para a Europa

Foto: Reprodução / Instagram

Ivan Guimarães desenvolve trabalhos por meio de algumas técnicas, como estêncil, desenho com óleo pastel, xilogravura, instalações livres em espaços urbanos e pintura acrílica. Os trabalhos da série “O colecionador de paisagens”, composta por cerca de 50 obras, foram expostos na Art Source, a maior feira internacional de arte da Irlanda. As peças são, em sua grande maioria, obras únicas com matriz perdida, uma vez que a impressão é feita em vários estágios.

A concepção das obras deriva de acumulações de detalhes descobertos nos trajetos urbanos do artista: galhos caídos, estrias dos muros e fragmentos de objetos da rua são utilizados como matrizes no instante da descoberta. Algumas dessas impressões continuam em processo, no ateliê do artista, com incorporações de outras impressões de matrizes de xilo desenvolvidas para tencionar a poética das obras.

Conforme explica Jacqueline Medeiros, pesquisadora e curadora em artes visuais, Ivan Guimarães tira proveito da contemporaneidade do tempo de hoje ao capturar panoramas conflitantes ou multifacetados da sua rotina urbana, em que todo fenômeno diário é suscetível de se tornar ato artístico a partir da percepção do artista, o que é uma questão de escolha. Também não lhe interessa a estética figurativa que a xilogravura de cordel solicita, mas, sim, a captura do instante de um detalhe mínimo da paisagem. Assim, as suas xilos assumem um lugar na denominada Arte Contemporânea.

Artista cearense Ivan Guimarães leva exposição de xilogravuras para a Europa

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Ivan Guimarães comenta a participação na Art Source

Portal GCMAIS – Como se apresenta a poética do seu trabalho?

Ivan“Meu trabalho surge do flânerie pela cidade, do que parece escapar do nosso olhar e da nossa sensibilidade tão atarefadas pelas urgências da vida. É exatamente aí que vou colhendo falas ou gritos silenciados. Aquele árvore cortada, objetos deixados, ranhuras e rastros de histórias abandonadas pelo caminho. Vou transferindo essas ‘impressões’ para as superfícies, ativando essas memórias, que serão recontadas pela intermediação das possibilidades das artes plásticas. Talvez recriando e permitindo que novas histórias fluam numa circularidade de vidas cruzadas.”

Portal GCMAIS – Onde a sua arte se encontra na história da arte?

Ivan – “Não é o papel do artista encontrar um lugar para si nessa arquitetura da história da arte. O seu agir surge da urgência da sua expressão como uma necessidade vital. Sou atravessado pelas questões atuais, pois é aqui que sou impactado. O que é humano me afeta. Sou de um tempo, de um lugar, tenho plena consciência disso. Sim, o conhecimento que me antecedeu também está presente, pois somos parte desse todo indivisível. O meu fazer artístico é o ar que me impulsiona e me conduz. Bem, o artista é sobretudo um inadequado (risos).”

Portal GCMAIS – Quais os temas mais presentes no seu trabalho?

Ivan – “Acredito na potência de tudo que existe. As categorias do belo, do bom e das certezas precisam ser desconstruídas sempre. A arte tem esse papel transgressor intrínseco. Sou arrebatado pela natureza, pelo seu deslumbre, mas, principalmente, pelo ínfimo, a menor parte. Sou fisgado pelo cósmico contido em cada partícula e em cada ato cotidiano. O que as culturas geram também é parte importante das minhas escolhas, e construo, ao mesmo tempo, pontes e abismos entre a cultura e o que está posto independente da nossa vontade. Nesses encontros e desencontros, apelo para a pele como sensor do que vive. A pele é o nosso céu e o inferno. Espiritualizo assim o fazer mais efêmero, mais desinteressante, mais corriqueiro. Para tudo que nos controla, apresentado como verdade, tenho sempre uma desconfiança. Acredito que levo isso para a minha obra.”

Portal GCMAIS – Que lugar a arte ocupa na sociedade atual?

Ivan – “A arte funciona para nos desinstalar. Duvide sempre daquilo que você entende rapidamente. A arte existe para desestabilizar a sua razão e seus sentimentos, assim, misturados. Ela cobra que você se lance. Em qualquer lugar, em qualquer tempo ou circunstância, a arte estará vigilante para puxar o tapete, não necessariamente para derrubar, mas para mover. O mover é vital. Muitas vezes, entro numa exposição, e um detalhe de uma obra me chama para o duelo. Mesmo assim, sabendo que serei desafiado, não abdico de ir. É um consumir-se. Não é fácil o apreciar da arte e o fazer arte. Considero que um alimenta o outro.”

Portal GCMAIS – Para você, o que representa expor numa feira de arte internacional?

Ivan – “Sempre gostei do ambiente de feira. Gostei desde criança. Observo as pessoas, seus movimentos de admiração, de indignação, de troca, de satisfação. Tudo ali está nos extremos. Há excesso de cor, de gente, de cheiros… há os que enchem as sacolas de compras, e os que contam os centavos para levar o mínimo. Penso sempre que é uma forma de misturar, de confundir, de amadurecer o nosso todo. Para o artista, expor em uma feira de arte é sempre um apresentar-se aos públicos mais diversificados. Não há sucesso nem fracasso. O artista fica desnudado de qualquer forma.”

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Curadora Jacqueline Medeiros sobre “O colecionador de paisagens”

“Ivan Guimarães vive em uma região do Brasil reconhecida como tradicional na xilogravura, uma técnica que, originariamente, consiste em esculpir em alto-relevo em um pedaço de madeira, possibilitando a impressão do espelho da imagem talhada sobre o papel. A xilogravura, nos seus primórdios, era utilizada como imagem ilustrativa de folhetos de literatura de cordel, escritos frequentemente de forma rimada e originados de relatos orais sobre a vida no campo do Nordeste do Brasil. Por isso, a xilo tradicional tem como características os traços firmes e identitários da cultura nordestina brasileira.

No entanto, Ivan tira proveito da contemporaneidade do tempo de hoje ao capturar panoramas conflitantes ou multifacetados da sua rotina urbana, em que todo fenômeno diário é suscetível de se tornar ato artístico a partir da percepção do artista, o que é uma questão de escolha. Também não lhe interessa a estética figurativa que o cordel solicita, mas, sim, a captura do instante de um detalhe mínimo da paisagem. Assim, as xilos assumem um lugar na denominada Arte Contemporânea.

É possível identificar essas características nos trabalhos aqui apresentados, cuja concepção derivam de acumulações de detalhes descobertos nos trajetos urbanos do artista: galhos caídos, estrias dos muros e fragmentos de objetos da rua são utilizados como matrizes no instante da descoberta. Algumas dessas impressões continuam em processo, no ateliê do artista, com incorporações de outras impressões de matrizes de xilo desenvolvidas para tencionar a poética das obras.

Um dado importante é que os trabalhos dessa série são, na sua grande maioria, obras únicas com matriz perdida, uma vez que a impressão é feita em vários estágios, e cada um deles significa a impossibilidade de repetir a impressão do estágio anterior, assim como na paisagem natural.

Ivan realiza ação de um colecionador de paisagem a registrar o que o seu olhar captura e o que pode lhe escapar no minuto seguinte. Paisagem também no sentido da definição na geografia, em que tudo aquilo que os sentidos humanos podem captar é paisagem, aquilo que a visão consegue enxergar e o que a audição escuta. Nesse sentido, tudo que o ser humano consegue sentir é uma paisagem, as xilos capturadas por Ivan, como ele afirma, “existe ali uma vida que está se alterando sempre, vou ao seu encontro observando esses movimentos, espaços, objetos que passam a ganhar outros sentidos e significados nos meus trabalhos”.

A busca do artista é no sentido de que o papel possa receber as projeções livres e imediatas apreendidas pelo ato de transformação do instante com o mínimo de intervenção de dados racionais. Para o artista, é um modo de absolver e devolver ao mundo o que o inquieta e não pode ser represado. É o resultado do livre exercício da subjetividade, como expressão de um sentimento particular que corresponde não só ao artista, mas a uma visão cósmica.”

Conheça Ivan Guimarães

Artista autodidata e entusiasta da história da arte, Ivan Guimarães tem recebido o Direito de Palavra, que o credencia a apresentar ao público as coleções dos principais museus, como o Louvre, d’Orsay, Prado e Reina Sofia. O desejo de compartilhar experiências e conhecimento o levou a liderar grupos de estudantes nos principais museus europeus, ensinando arte e cultura há mais de 20 anos. As diversas apresentações guiadas que conduziu em museus e seus estudos sobre a arte o convocaram ao fazer artístico. A arte contemporânea com todo o seu potencial transformador, que se traduz em existência e resistência, que ressignifica o espaço cotidiano, que desperta novos sentidos no coletivo, impulsionou Ivan Guimarães a iniciar suas próprias produções.

Há cinco anos o artista desenvolve trabalhos por meio de técnicas como estêncil, desenho com óleo pastel, xilogravura, instalações livres em espaços urbanos e pintura acrílica. Seus trabalhos já foram selecionados para exposições no Brasil, a exemplo das coletivas “Gravura de ponta a ponta”, no MAUC (Museu de Arte da UFC), e “Festival Sérvulo Esmeraldo 90”, na Universidade Regional do Cariri. Sua coleção de xilogravuras foi exposta na Art Source, em Dublin, de 11 a 13 de novembro de 2022.

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