A (des)construção democrática
O debate acerca das limitações do regime democrático não é exclusivo da sociedade ou do momento histórico no qual estamos inseridos. Sobretudo, com a consolidação do modelo representativo, autores como Rousseau (XVIII) alertaram sobre a incompatibilidade entre a soberania popular e a alienação do poder.
De Rousseau aos tempos atuais, as possibilidades de participação política foram alargadas e mais pessoas foram incorporadas ao processo de escolha de representantes, mas, paradoxalmente, os déficits de representação foram se acumulando ao longo dos séculos e causando um desencantamento em relação a esse formato, no qual o povo exerce o seu poder, mormente, através de representantes.
Analisando a realidade brasileira, esse desencantamento pode ser verificado com o surgimento dos Novos Movimentos Sociais; com os percentuais de votos brancos, nulos e também das abstenções; com o argumento do eleitor de que não votou no melhor candidato, mas no “menos pior”; com a ausência de monitoramento dos mandatos e até mesmo com o esquecimento do candidato escolhido no pleito.
Certamente, os sucessivos escândalos de corrupção, de prevaricação, podem ser apresentados como justificadores dessa falta de esperança. Proponho-me, ainda, a apontar outras razões para o déficit do modelo.
O déficit da representação
O sistema eleitoral brasileiro é de partidos políticos, mas as agremiações, em sua grande maioria, não dispensam esforços na formação de quadros, na discussão e na defesa de compromissos ideológicos ou programáticos, na administração de canais múltiplos de comunicação com a sociedade para prestar contas dos seus posicionamentos em relação aos seus membros.
Um outro elemento, que também diz respeito ao déficit da representação, é a pouca ou nenhuma participação de diversos segmentos da sociedade nas instâncias deliberativas. Sobre esse aspecto, é importante considerar que houve avanços significativos nos últimos pleitos, por exemplo, com o crescimento da participação feminina nas casas legislativas. Mas, assim como ocorre com outros grupos, ela ainda está muito aquém daquilo que seria importante para que a representação se aproximasse da heterogeneidade social, cultural, política, entre tantas outras, do País.
Ainda, é preciso debater seriamente o descompasso entre o que os representantes dizem e fazem e aquilo que é a necessidade ou expectativa do povo. Muitas vezes, esse distanciamento entre representantes e representados causa a sensação de que os governos administram cidades, estados, países vazios ou, o que pode ser ainda pior, como se os representantes fossem movidos, apenas, por interesses imediatos e egoístas.
A deficiência do modelo
A forma de financiamento das campanhas eleitorais também pode contribuir para deficiência do modelo, se considerarmos que ela inibe a participação de pessoas que reuniriam condições de representar, de maneira satisfatória, os interesses de parcelas significativas da sociedade, para as quais a Política é “coisa dos outros”.
Finalmente, o elenco de possíveis causas das deficiências do modelo representativo não se esgota aqui. A esperança de um modelo que satisfaça melhor as expectativas democráticas também não pode se esgotar. Afinal, se a conquista da democracia exigiu a luta, o relacionamento exige o cuidado, a correção de erros. E muitos são os debates acerca do aprofundamento da democracia, com instrumentos de participação direta, como plebiscitos, referendos, leis de iniciativa popular.
Como complemento, não menos importante, as novas tecnologias de comunicação podem ser instrumentos importantes para fornecer informações sobre o campo da representatividade e também para uma maior participação popular nas instâncias de poder. Ou seja, com mais democracia são construídas as alternativas para tudo o que falta no regime que melhor traduziu a necessidade de incorporação da soberania popular.
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