Detox corporativo: o que fazer quando o ambiente de trabalho é nocivo e faz mal?
O ditado popular de que uma maçã podre pode estragar as demais em uma cesta é conhecido em quase todos os países e continentes. A analogia também vale quando os seres humanos interagem num mesmo grupo. Se um deles está feliz, a chance de que outros tornem-se mais felizes aumenta consideravelmente. Porém, o contrário também é verdadeiro.
Estudo da Harvard Business School com mais de 60 mil funcionários de empresas de todos os tamanhos e setores distintos mostra que o ambiente ruim de trabalho desanima as equipes e afetam os resultados.
Características
São inúmeras as situações que indicam um ambiente nocivo à saúde mental e física, tais como a falta de respeito entre colegas, a pressão ininterrupta por resultados, o clima de tensão, gestores que estimulam concorrência desleal, utilizam de ironias e fazem críticas destrutivas.
“Com o passar do tempo, os comportamentos nocivos passam a fazer parte da cultura da empresa. Isso afeta diretamente as pessoas, a atmosfera organizacional e também os resultados. Só de observar a forma como as pessoas se relacionam umas com as outras e o jeito que tratam seus liderados, colegas, clientes e fornecedores dá para ter uma ideia do grau de toxicidade de uma organização. Um tema interessante para se observar em setembro, quando as discussões se voltam justamente para a saúde mental”, relata a consultora e professora de cursos de pós-graduação Luciane Botto, autora do livro Liderança Integral – A Evolução do Ser Humano e das Organizações (ed. Vozes, 344 págs.)
Íntimo, mas impessoal
Mais comum do que se imagina, o ambiente prejudicial à saúde costuma ter origem em gestores e naqueles funcionários considerados super estrelas – muito talentosos e produtivos no curto prazo, mas egocêntricos e que não se importam com os outros.
Quem viveu nesse tipo de local por algum tempo sentiu os reflexos negativos dessa cultura organizacional.
“A competitividade era absurda, tinha que provar a todo momento que era boa o suficiente para estar naquela empresa e viver para o trabalho. O desgaste foi tamanho que 15% do meu salário era usado só com remédios”, contou a executiva Márcia Souza – nome fictício, para garantia de sigilo – que atuou por sete anos numa empresa de bens de consumo.
Hoje, ela atua noutra companhia do ramo de pesquisa e inovação, tem mais qualidade de vida e presencia enorme diferença.
“O clima interno é muito bom, as pessoas sentem-se melhor e querem ficar aqui”, completou.
Ficar ou sair?
De acordo com o psicólogo, mestre em Educação e professor do UNICURITIBA, Dori Luiz Tibre Santos, a maioria dos indivíduos não percebe suas ações e o jeito que trata os demais.
“Quem se sente prejudicado deve falar com o agressor, explicar seu ponto de vista e pedir que mude o comportamento. Também é importante relatar ao superior”, observou.
Se o gestor não tomar atitudes, vale falar com os diretores da organização e, se for o caso, pedir afastamento. Santos também recomenda buscar apoio psicoterápico.
“Afinal, a maioria trabalha pela necessidade econômica e deixar uma empresa não costuma ser uma escolha simples”, disse.
Segundo o advogado especialista em Direito e Processo do Trabalho, Arno Bach Filho, as companhias devem ficar atentas, pois a Constituição Brasileira relata que é um direito dos trabalhadores terem um ambiente seguro e de bom convívio.
“As empresas devem ter códigos de condutas e meios de comunicação para denúncias com garantia de sigilo. Se não tiverem isso e não averiguarem os fatos, correm o risco de perder o funcionário e terem de arcar com indenizações por danos moral e material. Em casos extremos – em que a pessoa desenvolva síndromes que a tornem inapta ao trabalho – podem ser condenadas a pagar pensão vitalícia”, explicou.
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Gente feliz produz mais
A boa notícia é que cada vez mais as pessoas se dão conta de que existem saídas para essas situações.
“Temos um ambiente saudável, colaborativo e inclusivo. Numa das reuniões, a sugestão do estagiário era melhor que a do presidente, foi aceita e implementada naturalmente. O jovem ficou tão feliz, trouxe ainda mais ideias nas outras reuniões e todos ganharam juntos”, contou Rodrigo Alves, CEO da Fil Group Logística, que tem cerca de 30 colaboradores.
Não à toa a empresa mantém crescimento durante toda pandemia, está em expansão e vai contratar mais três funcionários para as áreas de operações, vendas e financeiro.
“Muitos colaboradores se dizem encantados com nossa filosofia e maneira de atuar. Alguns falam que nem acreditam na atenção e cuidados que recebem”, completou a gestora de Cultura e Pessoas da companhia, Sandra Maurer.
Outro exemplo de que é possível cuidar do time e alcançar bons resultados acontece na Tintas Vergínia. Com 265 funcionários nas lojas de Curitiba, Região Metropolitana e Ponta Grossa, a corporação ouve constantemente as sugestões internas. As equipes compartilham ideias, geram boas soluções, ganham autonomia e ficam mais motivadas.
“Até pouco tempo, a entrega e descarga de material na loja era manual. Um funcionário sugeriu instalar uma rampa no caminhão. Com essa ideia simples, mas muito importante, economizamos tempo. Noutra ocasião, um colaborador recomendou terceirizar os serviços de motoboy e tivemos ganhos financeiros”, relatou o gerente de Estratégia e Projetos, Eduardo Bathke.
“Sempre que preciso, sou ouvido. O ambiente é favorável, existe harmonia entre os setores, temos acesso direto aos gestores e não há pressão nas cobranças”, contou Willian Pagangliso, coordenador de Vendas e há cinco anos na companhia.
“Empresas são feitas de pessoas. São elas que fazem a mudança acontecer. Ambientes saudáveis têm mais chances de atrair, reter os melhores talentos e alcançar a alta performance. Além disso, cada vez mais a imagem e a reputação de uma companhia estarão ligadas ao modo como a equipe se trata. Essa humanização da gestão eleva o nível de engajamento, inovação e ajuda preparar o ambiente para o futuro que está por vir”, enfatizou a consultora Luciane Botto.
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