A agenda ESG (Environmental, Social and Governance, na sigla em inglês) é uma das principais impulsionadoras do avanço da pauta da Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I) nas empresas. Apesar desse movimento ainda ser considerado algo “novo” – existe desde 2004, mas ganhou mais força nas discussões estratégicas com a pandemia – a tendência dessas companhias diversificarem seus quadros está cada vez mais evidente, principalmente quando se fala em raça e gênero.
No que diz respeito à diversidade de raça, a presença de profissionais pretos em cargos de liderança aumenta a passos calmos, porém firmes. Segundo um levantamento feito pela EXEC, empresa especializada em seleção e desenvolvimento de altos executivos e conselheiros, somente neste ano houve um aumento de 67% no volume de contratações de líderes autodeclarados pretos ou pardos de ambos os sexos se comparado ao ano passado. Para cargos de diretoria, o indicador subiu 17%.
Segundo a pesquisa da EXEC, entre os setores que mais absorveram esses profissionais estão o de bens de consumo, com maior destaque (33%), e varejo, energia, agronegócio e serviços financeiros com 17% cada. João Philipe Lins, Engagement Director da EXEC, conta que as empresas de grande porte estão investindo na ampliação do quadro de líderes tendo a orientação ESG como base dessa transformação. “As companhias estão em busca de aumentar a presença de líderes pretos, seja em cargos gerenciais, de diretoria ou até mesmo em conselhos. Elas entenderam a contribuição que essa diversidade traz para a sua cultura organizacional e produtividade”.
João conta que, além das vagas cuja orientação sobre raça já vem definida, há também a demanda de incluir sempre candidatos pretos nos processos de seleção de líderes. “Há um entendimento de que esses profissionais podem contribuir não somente com conhecimento técnico e vivência profissional, mas também para estimular o aumento da presença de outros profissionais pretos em cargos de comando”, explica.
Dentro e fora de casa
Aumentar a presença de profissionais pretos em cargos de liderança é algo que ainda deve levar muitas décadas, mesmo que mais de 50% dos profissionais brasileiros sejam pretos e pardos. Para que haja uma equidade no mercado de trabalho com profissionais brancos, segundo um levantamento feito pelo Instituto de Identidade Brasil (ID_BR), isso ainda vai levar 167 anos, acontecendo somente em 2.190.
Lins ressalta que ainda há vários desafios que precisam ser superados para aumentar a representatividade dos profissionais pretos em espaços de decisão na sociedade como um todo. “Além de um escopo de contratação que releva alguns pontos – como a falta de domínio de um segundo idioma ou formação em faculdades de primeira linha – abrirem vagas afirmativas e apostarem em programas de estágio para jovens pretos, as companhias estão aproveitando a oportunidade também para capacitar internamente os profissionais pretos para ocuparem posições de liderança”.
A representatividade é algo que deve ser trabalhado nessas empresas, na visão de João Philipe. “É importante contratar profissionais pretos, mas também promover ações para desenvolvê-los dentro da empresa, para que eles se sintam parte da organização. Eles devem ser inseridos nas decisões, em projetos relevantes e empoderados para que esse sentimento seja disseminado e estimule outros profissionais pretos a seguirem o mesmo caminho”.
De acordo com um levantamento feito pelo Núcleo de Estudos Raciais do Insper, ter profissionais pretos em posições de gestão aumentam os investimentos e ampliam a inclusão. Para os pesquisadores, esses profissionais podem aumentar em 1,8% a participação de trabalhadores pretos na empresa, pois entendem os desafios enfrentados e valorizam as vivências, tendo um maior compromisso com a diversidade e inclusão.
Uma das principais barreiras para que os profissionais pretos se candidatem para posições de liderança é a ausência da representatividade de pessoas pretas ocupando essas posições. Uma pesquisa feita pelo Santo Caos, em parceria com o LinkedIn, apontou que 55% dos profissionais pretos entrevistados deixaram de participar de processos seletivos por acharem que não seriam bem recebidos no ambiente. E 27% relataram que isso ocorreu mais de uma vez. E mais: 45% deles nunca ocuparam cargos de liderança. Estes indicadores são reflexos do racismo estrutural vivenciado pelos profissionais pretos em seu ambiente de trabalho.
Gigantes como Danone, Ambev, Unilever, Pfizer Brasil, Natura & Co, Mercado Livre, Sanofi, entre outras corporações, estão colocando em prática diversas ações para aumentar a representatividade preta em sua liderança. Há alguns meses, outras corporações como Gerdau, iFood, Itaú Unibanco, LinkedIn, Magazine Luiza, Nubank e Vale criaram o movimento #CarreirasComFuturo, para disseminar iniciativas de diversidade e inclusão na força de trabalho brasileira, com foco no desenvolvimento de carreira e pertencimento de profissionais pretos em todos os níveis das organizações, incluindo a alta liderança.
Práticas como essas vêm de encontro à visão de 71% dos entrevistados da pesquisa do Santo Caos de que é necessário implementar mais ações para promover o desenvolvimento de carreira de profissionais autodeclarados pretos. Entre elas estão a revisão de critérios de contratação e promoção (32%), capacitação e treinamento de liderança (31%), recrutamento afirmativo (25%) e programas de mentoria (20%).
Para João Philipe, isso tudo é só o começo. “Estamos diante de uma longa estrada de transformações baseada na diversidade e inclusão. Acredito que essa representatividade de profissionais pretos na liderança deve aumentar nos próximos anos. Ainda tem muita coisa que iremos assistir”, conclui.
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