Tráfico nacional e internacional de drogas, principal fonte de renda dos grupos ilegais, movimenta cerca de R$ 400 milhões por ano
Facções revertem “mensalidade” dos apenados no bem estar e educação dos membros
Na última semana, o advogado Alaor Patrício Júnior foi preso pela terceira vez, sob suspeita de integrar uma organização criminosa. No ano passado, outra advogada, identificada como Elisângela Maria Mororó também foi investigada por relação com facções. Existem, pelo menos, seis representantes da categoria na mesma condição no Ceará. O estreitamento das relações entre profissionais do Direito e apenados sempre foi uma constante no sistema prisional. Entretanto, alguns dos grupos criminosos com atuação nacional, atentos à expansão e consolidação de poder, investem no bem estar dos membros e de seus familiares, financiando a educação e outras necessidades dos integrantes.
“Muito da capacidade interna de mobilizar pessoas para vinculá-las ao grupo [criminoso] está associado justamente a esse convencimento, que esse grupo tem condições de produzir um efeito, em termos de garantias de direitos, que sem esse envolvimento, sem vestir a camisa do grupo, a pessoa que está no crime está mais suscetível aos dispositivos de controle e abuso de autoridade”, explica o sociólogo Luiz Fábio Paiva, pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV), da Universidade Federal do Ceará (UFC).
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Em entrevista ao R7, o promotor Lincoln Gakiya, que investiga uma facção criminosa há 16 anos, afirmou que o tráfico nacional e internacional de drogas, principal fonte de renda dos grupos ilegais, movimenta cerca de R$ 400 milhões por ano. Parte desse montante é revertido em benefício dos seus filiados, que embora paguem taxas para serem considerados da “família”, recebem benefícios financeiros, caso estejam precisando.
No ano passado, o Ministério Público de São Paulo identificou cerca de cinco contas bancárias em que os repasses das lideranças nacionais eram feitos para os estados brasileiros, incluindo o Ceará. Conforme o promotor Adriano Saraiva, em uma das contas, uma mulher desempregada movimentou mais de R$ 40 mil em um ano. Na outra, uma técnica de alimentos, que recebe aproximadamente um salário mínimo por mês, teve acesso a mais de R$ 150 mil em um período um pouco maior que um ano.
Luiz Fábio explica que as facções surgem em um contexto de irmandade, em que os filiados precisam seguir um código de conduta rígido para receber a proteção prometida pela organização criminosa. “As facções atuam de maneira estratégica”, aponta. O código moral ainda impõe, segundo o especialista, o pagamento de uma taxa mensal. Esse valor é revertido nas necessidades do apenado e de sua família.
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“As facções elas surgem em um contexto de busca de proteção de apenados que tentam se organizar para se proteger no sistema prisional. Então a busca por advogados, pessoas que possam realizar suas defesas, sempre foi um processo que envolveu uma preocupação desses grupos”, garante.
Embora não detalhe como as facções podem financiar a formação acadêmica dos seus filiados, o especialista pontua que todos esses pagamentos são organizados e tabelados para que “se tenha uma estrutura de defesa” aos apenados do sistema prisional.
“A facção é um coletivo constituído por associações, relacionamentos, aproximações, conflitos e distâncias necessárias entre pessoas comprometidas em fazer o crime, desenvolvendo relações afetivas profundas, laços sociais elaborados como os de família, e um sentimento de pertença desenvolvido pela crença em determinadas orientações políticas e éticas que a sustentam. São coletivos móveis de pessoas que fazem o crime como um meio de integrar a sociedade, pois não visam à sua destruição, e sim à participação em um sistema de bens materiais e simbólicos agenciados de múltiplas maneiras. Em alguma medida, as facções são coletivos compostos por convergências de intencionalidades de alcances variados, com pessoas ocupando posições privilegiadas nos esquemas do coletivo e outras atuando em suas margens”, detalha Luiz Fábio, no artigo “Aqui não tem gangue, tem facção”, publicado em 2019.
Segundo o Ministério Público, em muitos casos, o papel desempenhado pelo filiado no grupo criminoso pode ser repassado para um parente mais próximo, caso ele não tenha condições de permanecer no cargo enquanto estiver preso. No ano passado, durante a Operação Prisioneiras, deflagrada na Vila Peri, em Fortaleza, o homem que comandava o tráfico de drogas e ordenava homicídios foi capturado. Em seu lugar, ficou a esposa, presa pouco tempo depois. Outras duas mulheres que trabalhavam como informantes da facção também foram presas.
Em nota divulgada no site oficial, a Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE) garante que, sobre o envolvimento de advogados com o crime organizado, a ordem “vai punir de forma severa todo e qualquer inscrito que faça isso”.
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