Depois que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes entendeu que é preciso equilibrar a vontade pessoal religiosa “com os limites médicos possíveis”, a suprema corte brasileira deve decidir uma questão polêmica que envolve ciência e religião. Os seguidores da religião Testemunha de Jeová não podem receber transfusão de sangue em qualquer procedimento médico, ainda que com a vida em risco. Mas o que vale na hora de decidir: a escolha individual do paciente ou da equipe médica, buscando salvar a vida do paciente?
>>>Siga o GCMAIS no Google Notícias<<<
Segundo a religião, alguns livros da bíblia cristã “proíbem tomar sangue por qualquer via”. E essa questão religiosa vem sendo debatida ao longo dos anos. Isso porque, segundo o especialista em direito médico Washington Fonseca, os direitos ao credo e à vida são cláusulas pétreas da Constituição federal e devem ser respeitados. Mas ele acredita que, ao debater o assunto, o STF deve manter a decisão que busca equilíbrio entre os dois direitos, considerando a possível emergência do caso ou não.
Ele ainda explica que em casos eletivos, como as cirurgias agendadas, por exemplo, a escolha do paciente deve prevalecer. Caso isso seja desrespeitado, o paciente pode acionar a justiça. Por outro lado, Washington Fonseca alerta que, em casos de emergência, onde não há procedimento alternativo para salvar a vida do paciente, a equipe médica deve decidir por salvar a vida da pessoa, sob o risco de responder por omissão.
Leia também | Hemoce implanta técnica para identificar doenças de coagulação do sangue
Os seguidores da religião Testemunha de Jeová defendem procedimentos médicos que conservam, durante as cirurgias, o sangue do próprio paciente, sem precisar da doação de outras pessoas, uma técnica mundial conhecida pela sigla, em inglês, PBM. Segundo o testemunha de Jeová, Adriano Faria, a comunidade não é contrária à ciência, mas busca por alternativas que já existem.
“As testemunhas de Jeová têm muito respeito pelas pessoas que doam sangue e também pelo trabalho feito pelos hemocentros. Quando ficamos doentes, nós procuramos os hospitais. A única restrição de tratamento é em relação à transfusão de sangue. Por isso nós pedimos aos médicos que usem técnicas que envolvem o gerenciamento do sangue do paciente, reaproveitado durante uma cirurgia, e esse gerenciamento pode ser aplicado em pacientes em geral, não apenas nas testemunhas de Jeová”, explica Adriano Faria.
No Brasil, há exemplos da aplicação do chamado Gerenciamento do Uso de Produtos Sanguíneos no Paciente, o PBM. No Ceará, a técnica PBM é estimulada por um programa criado em 2017, a partir da experiência de quase 20 anos no estado. Em nível mundial, existe a Sociedade para o Avanço da Gestão do Sangue, há 10 anos, que tem profissionais da área de saúde como membros.