Especialista explica quais danos podem ser causados ao local a partir da exploração excessiva da atividade turística e aponta soluções para o problema
Entenda os impactos do aumento do tráfego de veículos no Parque Nacional de Jericoacoara
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela gestão do Parque Nacional de Jijoca de Jericoacoara, lançou um edital de credenciamento de novos motoristas interessados em aquisição do selo, que libera o trânsito de Prestadores de Serviços de Transporte Terrestre de Passageiros para fins turísticos dentro do Parque Nacional de Jericoacoara, no Ceará.
A prefeitura de Jijoca de Jericoacoara, juntamente com o apoio dos municípios de Cruz e Camocim, que juntos fazem parte do parque nacional, questionam o edital e pedem a suspensão da iniciativa.
“Já são quase 3 mil profissionais que possuem legalidade para transitar dentro do parque nacional. Por isso procuramos o ICMBio, que acatou de imediato o nosso pedido, com a imposição de que a prefeitura apresentasse um plano de “carga” para mostrar a inviabilidade de novas autorizações. Estamos tentando impedir esta demanda, justamente para juntos com empresários, presidentes das cooperativas das três cidades; Câmara de Vereadores e a liderança “Unidos por Jeri”, na qual já agradeço o apoio, para cuidarmos do meio ambiente e evitarmos estragos ao nosso paraíso”, conta Lindberg Martins, prefeito de Jijoca de Jericoacoara.
Ainda segundo o prefeito, um profissional será contratado através de licitação e acordo com o ICMBIO, para formalizar um estudo de viabilidade técnica sobre danos que a iniciativa poderia causar ao meio ambiente e as dunas.
Trânsito de veículos causa desmonte das dunas, diz especialista
De acordo com o professor do Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará, Davis de Paula, a movimentação excessiva de veículos dentro do parque provoca uma série de danos à preservação das dunas, que ao longo dos anos já vêm sofrendo com o desgaste provocado pela atividade turística na vila, que a cada ano vem cada vez mais recebendo turistas do Brasil e do exterior.
“A compactação do solo, que ocorre tanto na Vila de Jericoacoara como no seu entorno, levando quase à impermeabilização do solo, mesmo não tendo, por exemplo, cobertura de asfalto, mas isso diminui bastante a infiltração da água no subsolo, que é importante para aquela região. Nós temos também o problema da degradação da vegetação pioneira pela passagem de veículos, de pessoas”, explica.
O pesquisador esclarece ainda que o desmonte das dunas impacta na formação original dos bancos de areia e consequentemente no seu desaparecimento precoce ao longo dos anos. Conhecido ponto turístico da região, a Duna do Pôr do Sol já perdeu metade de sua altura original nos últimos anos.
“Você tem aí um pacote que envolve desmonte de dunas, seja por veículos de tração automotor, de tração animal, seja pela visitação extrema desse parque, pelos seus usuários. Tudo isso vai forçar, por exemplo, e vai impactar e acelerar a migração de areias, ou modificar os caminhos com que essas dunas vão se movimentando dentro do parque. A partir daí você alterar todo o sistema de resiliência ambiental, que seria a capacidade desse sistema de absorver impactos”, complementa.
Por estar localizado em uma área de difícil acesso, o Parque Nacional de Jericoacoara acaba atraindo motoristas não credenciados, seja para atividade turística clandestina, seja pela visitação de turistas ou nativos que utilizam seus carros particulares para transitar sobre as dunas.
“Estamos falando de uma área que já é de difícil acesso. Se você observar, temos vários carros credenciados para transporte de turistas que transitam diariamente pela região. Então já aí você tem uma pressão desses veículos cortando esses sistemas dunares e descaracterizando esses sistemas em prol de um desenvolvimento turísticos na Vila de Jericoacoara. Além desse contingente de veículos associados a um grande sistema para desenvolvimento da atividade turística, você tem uma quantidade considerável de carros particulares que acessam a área do parque”, afiram o professor.
Ações para desenvolvimento sustentável poderiam reduzir impactos
Para evitar a degradação ambiental do parque e tentar manter a vila preservada, o professor listou algumas ações que poderiam ser adotadas tanto por gestores públicos como por turistas e pelos próprios nativos no sentido de promover a sustentabilidade da região a longo prazo. Vejamos algumas dessas ações:
- Implantação de num projeto contínuo de educação ambiental que envolva os moradores locais, as escolas, os turistas e os grandes empreendedores;
- Pensar em um grande projeto de sinalização, que tanto pode ser social, como cultural e ambiental, esse sistema pode sempre estar alertando o turista em preservar as condições ambientais da região;
- Estabelecer um programa de monitoramento ambiental contínuo tanto da qualidade como quantidade do fluxo turístico local e o quanto esse fluxo impacta na qualidade de água subterrânea, na geração de resíduos sólidos, poluição, contaminação, emissão de gases;
- Criação daquela que seria a primeira escola de turismo sustentável, e a própria vila seria o grande laboratório dessa escola e pensar com os moradores locais, empreendedores e visitantes os rumos do turismo a longo prazo, como por exemplo, até o ano de 2050.
Parque Nacional de Jericoacoara
O Parque Nacional de Jericoacoara situa-se nos municípios de Jijoca de Jericoacoara, Cruz e Camocim, no litoral oeste do estado do Ceará. A região concentra algumas das mais belas e mais visitadas praias do estado.
O local foi criado em fevereiro de 2002, a partir da recategorização parcial da Área de Proteção Ambiental de Jericoacoara, estabelecida pelo Decreto nº 90379 de 29 de outubro de 1984, nos municípios de Jijoca de Jericoacoara e Cruz.
Proposta de gestão compartilhada do Parque Nacional de Jericoacoara
Um proposta do Governo do Ceará para a Gestão Compartilhada do Parque Nacional (Parna) de Jericoacoara foi encaminhada ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
O objetivo é estabelecer, entre a União, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Estado do Ceará, a gestão do Parque Nacional de Jericoacoara de forma compartilhada.
Construída coletivamente, após escutar a população da região e todas as partes interessadas, busca garantir o fortalecimento das comunidades do entorno e o desenvolvimento do turismo ecológico, priorizando a preservação dos ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica da Unidade de Conservação (UC) federal.
As Secretarias do Meio Ambiente e Mudança do Clima (SEMA), do Turismo (SETUR), e a Procuradoria-Geral do Estado Ceará (PGE-CE) e coordenaram a construção da proposta.
De acordo com o assessor técnico de Meio Ambiente, do Gabinete Executivo da SEMA, Lucas Peixoto, a proposta foi encaminhada no final do mês de abril.
“Ficamos focados em construir uma boa proposta de gestão compartilhada para seguir no próximo passo”, disse. As audiências para escutar e acolher as sugestões da população e todas as partes interessadas ocorreram no período de 16 a 17 de março, nos municípios de Camocim, Cruz e Jijoca de Jericoacoara.
A secretária Vilma Freire, da SEMA, participou de todos os encontros. “Buscamos garantir que os termos do documento final ficassem de acordo com o que foi discutido, de forma a atender os interesses da classe trabalhadora, do setor produtivo e governos locais, garantindo a sustentabilidade dos recursos naturais”, afirmou.
Para a PGE-CE, que também se fez presente aos diálogos por meio da atuação da Procuradoria do Patrimônio e do Meio Ambiente (Propama), “o modelo de gestão compartilhada UC busca unir esforços da gestão pública com atores sociais e instituições locais”.
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