O povo tapeba, ao longo das últimas décadas, no estado do Ceará, conseguiu garantir à própria comunidade acesso a serviços essenciais, como saúde e educação. Os desafios, no entanto, persistem, com destaque para a preocupação sobre o direito a moradia e questões sobre o futuro dessa população indígena.
Os tapebas são resultado da mescla dos povos kariri, jucá, potiguara e tremembé e se organizam no município de Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), com mais de 8 mil pessoas integrando a comunidade.
Vó Isabel, mestre da cultura desse povo indígena, destaca que tem como grande desejo que o legado de resistência se mantenha como exemplo para gerações futuras. “O que eu queria mesmo era que os costumes indígenas não acabassem, que a história do sangue indígena não acabasse e o povo indígena não esmorecesse. É isso o que eu queria.”
Ela lembra que, antigamente, essas pessoas não podiam afirmar que eram indígenas, pois poderiam sofrer ataques. “Os índios tapebas não podiam se pronunciar como índios, porque eles eram caçados e eram mortos. Massacraram muitos índios, muitos mesmo, e daí pra cá a gente ficou com medo. Dizia assim: ‘eu sou tapeba, digo com orgulho.’ A gente ainda tem medo de pronunciar essa frase”, conta ela.
Educação
Ao longo dos últimos 40 anos, a comunidade conseguiu, em articulação com o poder público, garantir acesso a direitos fundamentais, incluindo a chegada de escolas estaduais e municipais. A artesã Bete Tapeba conta que nos anos 1990 chegou a dar aula debaixo de uma mangueira, sem condições de prover uma estrutura para o ensino das crianças. Hoje em dia, já são sete escolas disponíveis, sendo três estaduais e quatro municipais.
Conforme Iolanda Tapeba, diretora escolar, a educação indígena tem possibilitado a valorização da arte do povo tapeba no Ceará. “Hoje a gente está conseguindo manter e colocar em prática os valores, costumes e tradição do nosso povo.”
Foi por meio dessa educação que Júlio César, filho de pai tapeba, passou a se reconhecer como tal e valorizar os costumes e tradições do povo de que é descendente. “Comecei a participar de dança, apresentaçoes, toré, aí comecei a pegar gosto e saber minha origem”, explica. Ele conta ainda que com alguma frequência escuta comentários maldosos, relacionados à sua cultura, mas “entra num ouvido e sai no outro”.
Saúde
No que diz respeito ao acesso à saúde, também houve avanços ao longo das últimas décadas. Atualmente, no polo base, são 92 profissionais, entre médicos, enfermeiros, técnicos e agentes comunitários – 71 deles indígenas, que retribuem para a comunidade a formação adquirida e não deixam de lado as terapias ligadas à tradição dos tapebas.
“O indígena atendendo a própria comunidade é muito importante, porque conehce a própria comunidade, a reliadade, a questão cultural, da identidade mesmo”, pontua Leidiane Tapeba, responsável técnica do polo de saúde.
Terra
Em meio a isso, a principal preocupação do povo tapeba hoje em dia é a demanda pela posse definitiva da terra de origem, no estado do Ceará. O território ocupado pela comunidade se divide em 18 aldeias, ao longo de 5 mil hectares, mas até o momento não há demarcação.
Ao longo dos últimos anos, a terra passou por diversas invasões de posseiros, que limitaram atividades básicas dos indígenas, como a agricultura, pesca e até rituais próprios da cultura tradicional desse povo. “Não podemos ter os mesmos costumes porque não tem mais espaço pra gente. Se não tem mais espaço, o que nós ainda temos hoje é o nome”, conta Isabel Francisca.
Cláudio Alves, liderança indígena, pontua que ele próprio mora em um trecho que passa por processo de reintegração de posse. “Todo dia que nós dormimos e acordamos, estamos cada dia mais sabendo que a qualquer momento pode existir uma reintegração de posse”, diz ele.
Série “Povos Originários”
O Jornal da Cidade, da TV Cidade Fortaleza (canal 8.1), estreou na última segunda-feira (15) a série de reportagens especiais: “Povos Originários – A Tradição Indígena no Ceará”. O conteúdo mostra como os povos originários cearenses, espalhados por 18 municípios, fortalecem o legado de resistência para afirmar a identidade, a defesa das tradições e cultura, assim como a luta pelo direito à terra e por ocupação de espaços na sociedade.
Anacé, Gavião, Jenipapo-Kanindé, Kalabaça, Kanindé, Kariri, Pitaguary, Potiguara, Tapeba, Tabajara,Tapuia-Kariri, Tremembé,Tubiba-Tapuia e Tupinambá. São as comunidades que diariamente, seja ao pé da serra, na Região Metropolitana de Fortaleza, litoral ou sertão, celebram a memória dos seus antepassados, educam suas crianças por meio de escolas indígenas, se organizam enquanto etnias sobreviventes.
Cada povo rememora as características de seus antepassados. Por meio da pesca, caça, artesanato, confecção e utilização dos penachos e cocares, das danças, das crenças, e de tantos outros tesouros guardados pela tradição. As comunidades também se erguem em conjunto na reivindicação pela regularização das demarcações de terra.
A série “Povos Originários – A Tradição Indígena no Ceará”, conta em cinco episódios a luta desses povos, no Jornal da Cidade, a partir de 19h15.
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