No último final de semana, o Brasil voltou a registrar um caso autóctone de cólera, após 18 anos. A confirmação da doença em Salvador, na Bahia, alerta para os riscos da enfermidade que já fez diversas vítimas no Nordeste do País. O estado do Ceará enfrentou um surto na década de 1990.
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No início de 1991, houve relatos de casos de cólera no Amazonas. Três anos depois, em 1994, o surto continuou a se espalhar, com 51,3 mil casos no Brasil, sendo 49,2 mil apenas na Região Nordeste. Na época, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Bahia, Rio Grande do Norte e Alagoas apresentavam os maiores índices de incidência, segundo o Manual Integrado de Vigilância Epidemiológica da Cólera do Ministério da Saúde.
Em entrevista ao Portal GCMais, o ex-secretário de saúde do Ceará, Anastácio Queiroz, especialista em Infectologia, afirmou que o surto ocorrido no estado na década de 1990 foi um drama devido à qualidade da água no estado. “A água na época estava muito salobra, o gosto muito inadequado, e as pessoas passaram a beber água de poço. Isso causou um problema de saúde pública muito grave para a cidade”, comentou.
Em relação à chance da doença voltar a circular em 2024, o especialista afirma que é uma “possibilidade remota”, mas é preciso estar atento na qualidade da água e alimento que ingerimos.
” É importante estar atento, mas a possibilidade de nós termos cólera no Ceará é extremamente remota, porque nós não temos cólera no momento no Brasil, e realmente a cólera hoje é uma condição muito mais dos países da África subsariana”, frisou.
Surto de cólera no Ceará
No Ceará, a situação de emergência foi decretada pelo então governador Ciro Gomes quando, em 1994, a Capital registrava mais de 10 mil casos. A principal medida para combater a doença foi a distribuição de hipoclorito de sódio em cada residência por agentes de saúde.
O plano de combate a cólera definiu um prazo de 90 dias para levar a doença a níveis endêmicos – ou seja, com média de dez casos ao dia.
A principal medida foi o treinamento de 2.100 agentes de vigilância recrutados entre técnicos da saúde, policiais militares e lideranças comunitárias. As escolas da rede pública e privada incluíram aulas de educação sanitária nos currículos e treinaram os estudantes para o combate ao cólera.
A primeira mulher a assumir a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), Anamaria Cavalcante, que ocupava o cargo na época, falou sobre como o estado passou pelo surto de cólera.
“A cólera chegou ao Ceará vinda do Pará. Um cearense, que morava no interior do Pará, contraiu a doença e chegou ao Brasil pelo Rio Sul Limões, da base amazônica. E aí ele veio direto da terra dele, da cidade onde morava, no estado do Pará, para a cidade de Quixadá”, afirmou.
Segundo a médica, a Secretaria de Saúde se mudou da capital para acompanhar de perto os primeiros surtos da doença que começaram em Quixadá. “Naquela época, não tínhamos celular, não tínhamos computador. Então, nós nos mudamos. Instalamos a Secretaria de Saúde do Estado do Ceará exatamente na cidade de Quixadá, e aí começamos a monitorar,” afirma Anamaria.
Anamaria relembra que a cólera foi combatida no Ceará através da ajuda dos Agentes de Saúde de Endemias e por meio do Monitoramento das Doenças Diarreicas Agudas (MDDA).
” Teve um ponto muito importante, que foi fechar as barreiras. Então, todas as pessoas que vieram do norte do país, que chegavam principalmente nas rodovias, elas eram monitoradas para ter certeza de que não estavam já com o vibrião colérico. E aí eles eram acompanhados pelos agentes de saúde, pelas unidades básicas, pelos regionais de saúde, para que aquele caso se repetisse e fosse logo tratado”, comentou.
A falta de saneamento básico, o consumo de água sem tratamento e a manipulação inadequada dos alimentos foram fatores que contribuíram para a disseminação da cólera. Segundo o Ministério da Saúde, houve uma redução significativa no número de casos no país a partir de 1995 e a epidemia apresentou um declínio em 1999. Os últimos casos registrados no Nordeste foram notificados em 2005, em Pernambuco e desde 2006 não eram registrados casos autóctones (transmissão local) no Brasil.
Cuidados
A cólera é uma doença infecciosa intestinal aguda, transmitida por contaminação fecal-oral direta, ingestão de água ou alimentos contaminados e ainda de pessoa para pessoa. A bactéria da cólera está ativa na natureza. A propagação pode ser evitada com medidas de higiene pessoal adequadas e, sobretudo, com saneamento básico.
Cerca de 75% das pessoas infectadas permanecem assintomáticas. Formas graves da doença devem ser tratadas imediatamente para evitar complicações e, em casos extremos, a morte. Conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS), de janeiro a março deste ano, 31 países registraram casos ou surtos de cólera A região africana é a mais impactada, com 18 países afetados.
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