Moradores relatam vazamentos de petróleo e impactos na pesca artesanal em regiões afetadas pela atividade
Especialistas alertam para riscos ambientais com expansão da exploração de petróleo no Brasil
Com a intensificação da exploração de petróleo no país, moradores de áreas costeiras vêm denunciando problemas como vazamentos, acidentes e aumento nas emissões de gases de efeito estufa. Enquanto comunidades tradicionais relatam impactos diretos em seus modos de vida, especialistas contestam a urgência com que o Brasil tem buscado abrir novas áreas para produção, em um cenário de previsível redução na demanda global por combustíveis fósseis.

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Mudanças no cotidiano das comunidades pesqueiras
Humberto Sales Almeida, pescador da Baía do Araçá, em São Sebastião (SP), conta que sua atividade foi profundamente afetada após o avanço da indústria petrolífera na região.
“Hoje temos um porto de carga seca e petroleiros navegando exatamente onde pescávamos. Não conseguimos mais acessar essa área devido ao tráfego intenso de navios. Já houve casos graves, inclusive com risco à vida, e ainda assim a Capitania dos Portos nos multa por estarmos em nosso próprio território”, relata.
Em Caraguatatuba, a pescadora Ladisla Crispim dos Santos lembra do tempo em que sustentava a família com a coleta de mariscos.
“O berbigão era abundante. Bastava cutucar a areia com o pé. Depois do segundo vazamento de óleo, ele praticamente sumiu”, diz.
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Número de acidentes cresce
Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o Brasil registrou 731 incidentes marítimos envolvendo operadoras do setor em 2024 – o maior número desde 2012, quando começou a série histórica. Os registros incluem desde falhas técnicas até acidentes com trabalhadores e problemas de saúde ocupacional, com ou sem derramamento de óleo.
Pescadores afirmam que os produtos químicos utilizados para dispersar o óleo também causam danos ao meio ambiente, afetando recifes e a reprodução de espécies marinhas.
Danos econômicos, sociais e ambientais
Um relatório elaborado pela Fiocruz e pelo Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT), em parceria com o Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina, aponta prejuízos econômicos, sociais, culturais e emocionais causados pela cadeia de exploração e produção de petróleo e gás.
Segundo Ana Flávia Pinto, pescadora de Ubatuba (SP) e coordenadora da Frente de Luta da Pesca Artesanal, a presença constante de grandes embarcações tem reduzido o volume de pescado e aumentado os riscos para os pescadores.
“Além de ameaçar nosso sustento, vivemos com medo de acidentes. Já tivemos redes danificadas e até situações em que barcos quase nos atropelaram”, relata.
Novas áreas em leilão
No próximo dia 17 de junho, a ANP vai promover o 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessões, com o leilão de 332 blocos de petróleo e gás. Destacam-se 47 blocos localizados na Bacia da Foz do Amazonas, na Margem Equatorial – região entre o Amapá e o Rio Grande do Norte, considerada uma nova fronteira petrolífera com estimativas de 30 bilhões de barris, segundo a Petrobras.
Apesar de uma nota técnica emitida em 2020 permitir o avanço dos leilões, a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) ainda é exigida. O Ibama, no entanto, já aprovou o plano de monitoramento da fauna para o bloco FZA-M-59, passo necessário para obter a licença de perfuração em águas profundas no litoral do Amapá.
Críticas à pressa na exploração
Para o engenheiro ambiental Juliano Bueno de Araújo, diretor do Instituto Internacional Arayara, a estratégia do governo representa uma “corrida contra o tempo” para extrair petróleo antes que a demanda global entre em declínio.
“Mesmo que os leilões deem certo, o primeiro barril só deve ser produzido daqui a oito anos. Até lá, a demanda já terá mudado”, afirma.
Ele também critica o discurso de que a exploração trará desenvolvimento regional. “Prometeram que o pré-sal resolveria os problemas da saúde e da educação no Brasil, o que não se concretizou”, afirma.
Projeções indicam queda na demanda mundial
A Agência Internacional de Energia (IEA) projeta desaceleração no consumo global de petróleo até 2030, impulsionada por políticas de eficiência, veículos elétricos e tecnologias de energia limpa.
A Petrobras admite que o pico de produção será alcançado em 2029, mas defende a abertura de novas frentes para evitar a necessidade de importar petróleo no futuro. Para a estatal, a Margem Equatorial é estratégica para garantir a autossuficiência energética do país nos próximos dez anos.
Riscos à competitividade e à imagem internacional
Ricardo Fuji, especialista em conservação da WWF-Brasil, questiona a viabilidade econômica e ambiental do petróleo brasileiro frente à concorrência de países como Arábia Saudita e Catar, que produzem com menores custos e emissões.
“Se a demanda global cair, os produtores menos eficientes, como o Brasil, perderão espaço. Além disso, insistir nessa rota enfraquece a posição do país nos fóruns internacionais sobre clima”, afirma Fuji.
Ele sugere que o Brasil aposte no protagonismo em fontes renováveis. “Temos liderança em biocombustíveis, e estamos avançando em solar e eólica. Esses são os caminhos para oferecer energia limpa ao mundo e influenciar positivamente a transição energética global.”
Contradição com a crise climática
Carolina Marçal, gestora ambiental do ClimaInfo, considera incoerente a abertura de novas áreas para exploração de petróleo com o cenário atual de urgência climática.
“O Brasil já é exportador líquido de petróleo. Esse produto será queimado em algum lugar e contribuirá para o agravamento da crise climática”, alerta.
Reservas já seriam suficientes
De acordo com estudo da InfoAmazonia, o país possui reservas provadas suficientes até 2040, considerando os compromissos internacionais de redução de emissões. Sem exportar, os estoques atuais atenderiam ao mercado interno até 2045.
“A verdade é que o Brasil não precisa abrir novas áreas de exploração. A demanda está caindo e as reservas existentes são suficientes”, defende Marçal.
Petrobras: risco de voltar a importar petróleo
A Petrobras, por outro lado, sustenta que, sem novos projetos, a queda natural da produção pode levar o país a importar petróleo a partir de 2034. A avaliação foi feita pela diretora de Exploração e Produção da estatal, Sylvia Anjos, durante evento na Coppe/UFRJ.
Transição e desenvolvimento
Para Carolina Marçal, o futuro do país passa por uma industrialização baseada em energia renovável, com salvaguardas socioambientais.
“A experiência mostra que o petróleo concentra renda e beneficia poucos. A transição energética pode ser uma oportunidade real de desenvolvimento sustentável”, conclui.
Com informações da Agência Brasil
Leia também |Petróleo: Petrobras inicia operação da maior unidade de produção do pré-sal no Brasil
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