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Entre o real e o virtual: a amplitude do nosso habitat

Em qual mundo habitamos? Constantemente com os pés fincados no mundo real, mas as mãos e os olhos sequestrados por tudo que compõe o mundo virtual. Essa tem sido a norma.

E os pensamentos, onde fazem morada? A liberdade agora é regulamentada pelo real e pelo virtual. Tensos, apreensivos, ansiosos, estamos constantemente em alerta, pois o que nos cerca e nos censura, muitas vezes, não é tocável. O outro não está mais, somente, na presença física ou na figura que introjetamos de alguém. Existem inúmeros outros. A maioria desses sequer conhecemos, mas estão ali, habitando o virtual e prontos para disparar em resposta a qualquer iminente ameaça, por menor que seja. O “Black Mirror” ou qualquer ficção científica já surpreendeu, mas hoje é balela ou são simples relatos de um cotidiano que espantaria os humanídeos de 30 anos atrás.

Deixamos de perguntar, olhando no olho, e agora vasculhamos as redes para tirar as nossas próprias conclusões. Nunca a palavra foi tão minha, somente minha, sendo quase impossível saber o que realmente o outro quer dizer. Não me aproximo para expressar bons afetos, no máximo dou uns likes. Elogiar alguém na ‘cara limpa’? Não (essa ideia parece até angustiante para alguns). É preferível deixar algum comentário no feed. Até porque posso deletar a qualquer sinal de frustração com a figura antes admirada.

E os afetos ruins? Esses alardeamos com maestria e sem pudor. Dentre tantas características do limbo entre o real e o virtual, a perecibilidade é marcante. A casa nova do vizinho, o carro de última geração do chefe, a viagem aos lugares paradisíacos, tudo não passa de meta rasa, até porque, tudo passa muito rápido no display desse smartphone que, por sinal, já está ultrapassado. A cada minuto, tudo fica obsoleto e o real, mais uma vez, vai perdendo espaço pro virtual.

Nesses mundos, cada vez menos pele, menos calor, menos corpo, mais falas, mais críticas, mais julgamentos, inúmeros fomentos para o desamor. Se era mais fácil viver antes? Não sei. Posso dizer somente que antes cada cabeça era um mundo, hoje me pergunto quantos mundos estão em nossas cabeças.

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Thiago Macedo

Médico psiquiatra e escritor

As opiniões não refletem o posicionamento do Grupo Cidade de Comunicação.

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